quarta-feira, 9 de abril de 2014

O CASO DA CRIMEIA

Afinal, a Crimeia é de quem?

Por Sasha Yakovleva*, especial para Gazeta Russa

Crimeia. O mundo inteiro está acompanhando as notícias que passam em seu território. Rússia, Ucrânia, Ucrânia, Rússia… Alguém vai ter que vencer. Mas o que realmente sabemos sobre a península além do conflito atual?

Historicamente, a Crimeia é diferente em relação à cultura dos dois países que estão na disputa por suas terras. Na verdade, a península tem muito mais influência oriental do que eslava. Por séculos, suas cidades acolhiam mongóis, tártaros, turcos… Os russos chegaram só no século 18.
História da península
Em 1475, quando os otomanos invadiram e dominaram seu território, a Crimeia passou a ser uma base de apoio em guerras contra povos russos. Naquela época, moravam na península mais de 1 milhão de pessoas, entre eles cerca de 200 mil tártaros.
Em 1774, no final da Guerra Russo-Turca, quando o Império Otomano assinou o tratado Kuchuk Kainarji com o Império Russo, o canato da Crimeia [governo comandado por um cã, título dos imperadores mongóis, descendentes de Gengis Khan] se tornou independente, mas continuou sob influência russa.
Já em 1783, a imperatriz Caterina, assinou um manifesto que reivindicava a anexação completa da Crimeia ao Império Russo.

Após a Revolução de 1917, foi criada a República Autônoma Soviética e Socialista da Crimeia, em 1921.
No dia 19 de fevereiro de 1954, o governo da península foi transferido para a República Soviética da Ucrânia. Existem várias teorias sobre essa decisão. A primeira hipótese diz que Nikita Krushchev, líder soviético da época, participou da violenta repressão exercida por Josef Stalin na Ucrânia e, depois da morte do ditador soviético, não conseguiu se livrar do sentimento de culpa. Dar a Crimeia de presente para os ucranianos, portanto, seria um jeito de mascarar seus atos violentos.

A segunda hipótese, mais improvável, fala da influência da cultura ucraniana na vida de Krushchev, afinal sua esposa era ucraniana e ele também tinha paixão por samogon (uma bebida caseira parecida com a tradicional vodca) e canções do país. É estranho até de imaginar!

Uma terceira teoria diz que a junção ocorreu na época da comemoração dos 300 anos do Tratado de Pereyaslav, em 1954. O tratado foi um acordo feito em 1654 entre cossacos e o tsar russo Aleksei 1º. A ideia era fundir o território da Ucrânia com o Império Russo. Os cossacos pediram ao tsar proteção e prometeram servir ao império com dignidade. Segundo essa hipótese, Nikita Krushchev decidiu reunir a Rússia e a Ucrânia nessa mesma data, 300 anos depois, para repetir o ato de junção de dois povos-irmãos.

A última teoria revela que, na verdade, logo depois da Segunda Guerra Mundial, Stalin mandou para a Crimeia, destruída por bombardeios nazistas, russos de regiões nórdicas do país, com o intuito de reerguer a economia da península.
Para quem era acostumado com invernos rigorosos, ele prometeu mar, sol, jardins e vinícolas. Só que quando os russos chegaram à Crimeia, não viram nada disso, apenas destruição e casas abandonadas pelos tártaros. Nesse período do pós-guerra, a península não evoluiu - pelo contrário, decaiu muito. A Crimeia se tornou um lugar depressivo, onde as pessoas passavam fome e não tinham nenhuma qualidade de vida.

Mas foi só quando os habitantes do lugar começaram a exigir mudanças, que Krushchev decidiu tomar uma atitude. Após visitar a península em 1953 e ver a desgraça com os próprios olhos, ele marcou uma reunião em Kiev para discutir a transição do território para a Ucrânia, o país soviético com a maior população de agricultores. A Ucrânia produzia tanto trigo, vinho, melancias, milho e óleo de girassol, que abastecia, inclusive, países vizinhos. Esse teria sido o ponto fundamental para a salvação da Crimeia. Obviamente, na época não havia divisão politica nem geográfica entre os países. As terras só migravam de uma república soviética para outra.
Mas tudo ficava dentro de uma grande e poderosa União Soviética. Havia até uma propaganda do governo para seduzir trabalhadores ucranianos a irem à Crimeia, com promessa de altos salários.

Se essa última teoria é a verdadeira, o plano até que deu certo. Hoje, em 2014, o lugar tem o maior número de vinícolas na Ucrânia, e é muito procurado por turistas que buscam praias e belezas naturais.
Até agora, o destino da Crimeia é incerto. Fará parte da Rússia? Continuará na Ucrânia? Não sei nada disso, apenas quero que continue charmosa e atraente para os nativos e para os visitantes estrangeiros, independente de que lado estará.

* Sasha Yakovleva é uma jornalista nascida em Moscou. Aos 25 anos, já morou na Ucrânia, Alemanha e Inglaterra. É atualmente casada com um brasileiro e reside em São Paulo. Ela é fascinada por tudo que se relaciona com a cultura russa e de outros países da ex-União Soviética. A ideia do projeto www.feijoadatchaikovsky.com.br nasceu quando Sasha começou a perceber tantas coisas parecidas e diferentes entre as culturas russas e brasileiras, que vão desde comida, tradições de casamento e aniversário até modo de se vestir e gírias.

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